sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Anatomia

O estreito cavalar do céu
irrompe de minha boca em brasa
(artéria ardendo um enxame de corpos nus
e roupas rasgadas:
memória do centro de minha nuca.)

: Guardo meus sonhos em coleiras.
reduto do medo que devora o medo
e os prédios e o trânsito de meus músculos cansados.

Ponho uma gravata castanha que enfileira cada pensamento
e subo no altar de dentes vermelhos da
eternidade da vida presente para
a glória esperada da vida futura.

Serei casto com meus amigos como a vértebra que
diz sim (de olhos fechados) à respiração.
Não estuprarei os meus amores com meus olhos.
Não dançarei no espaço alheio,
não comerei a flor do vizinho.

Cadente, calarei e pedirei o prato do dia.

E jamais a ardência de meu sexo
condenará a noite vazia:
irei mascará-la com todo o esforço de um bater de asas e contemplá-la
carnaval, samba e folia.

Cerrarei meus olhos e serei pai.
e a meia-noite de minha vida perseverá
nas entranhas de minha cria,
que será pai e parirá um milhão de
versos vencidos.

(É preciso calar.
É preciso renascer a família despedaçada nos retratos
É preciso se preocupar com a ordem do dia
e reproduzir, confiante, as palavras gráficas dos telejornais.

É preciso, antes de tudo, a calma dos avós
e a prudência de uma confeitaria.
É preciso assassinar o grito que jorra das fontes das praças.
É preciso não ser poeta,
não morrer jamais,
e denunciar com a ladainha dos velhos
os ossos moídos despregados da carne
da boa e incomparável alegria de ser
parte. )

Mas a parte, a parte de ser parte, o pedaço de ser parte,
não comportará jamais o ser que me vêm em mal-estar
quando construo e edifico este corpo puro.

Não posso ser puro. Mastigo os escritórios,
a história, as gravatas e os olhos de meu
filho.

Cuspo na boca (minha) quando me penso anjo.
Estupro meus amores com meus olhos
Condeno o dia e a noite por não serem demasiado belos
Conjugo o verbo feio, ridículo, de sapatos grandes.
Sou dois cachorros que devoram o intestino da vida presente.
Sou a fome das janelas e dos carros.

Sou o desejo das noites azuis:
impuras pelo desejar dos loucos,
famintas pelo desejar dos dias.

(uma casa de quartos fechados
explode enquanto expulso do mundo
a terra, a família, e o gosto terrível
que infesta meus dentes. )






















Thyago Marão Villela; 9/10/09

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